No domingo passado, Eduardo Cintra Torres escreveu, no Público, a primeira de duas partes de um texto intitulado “Cidadãos quê?”.
O texto fundamenta-se numa ideia forte: o jornalismo é muito mais do que recolher imagens e sons de episódios determinantes porque, como bem exemplifica, isso também uma câmara de uma estação (como as de Atocha) ou de uma caixa multibanco fazem.
‘Cidadãos-jornalistas’, escreve Eduardo Cintra Torres, é mais uma daquelas invenções de uma certa esquerda norte-americana para descredibilizar o exercício profissional da actividade. Ninguém se lembraria de falar em hipóteses semelhantes para outras profissões, como cidadãos-advogados ou cidadãos-médicos, pois não?
Pois não.
O Eduardo está coberto de razão. Aliás, a prosa dele parece-me, nesse sentido, uma das menos polémicas de sempre saídas da sua pluma (às vezes também) caprichosa.
Apesar disso, há uma coisa que me incomoda no texto.
E tem, sobretudo, a ver com o não dito.
O Eduardo diz-nos que jornalismo não é tirar fotos de acidentes nem gravar sons ou imagens de momentos decisivos – e isso parece-me indisputával. O que ele não refere é que estes desenvolvimentos vão forçar uma mudança no entendimento da profissão e no seu enquadramento social. E isso sim – o que ficou de fora – parece-me o mais relevante.
Combater o que diz serem ‘nuvens de fumo’ (textos como os de Dan Gillmor) com idênticas ‘fumaças’ não adianta grande coisa.
Não vale a pena continuar a assobiar para o ar, na ilusória ideia de que ‘aquilo’ não tem nada a ver com ‘isto’. Pois tem. E se os que sabem ‘disto’ não reflectirem a sério sobre o seu novo lugar, pode ser que ‘aquilo’ ganhe um peso maior do que seria desejável. E a culpa não vai ser ‘daquilo’. Vai ser de quem foge à conversa.
Archive for 4 de Novembro, 2005
Fugir à conversa
Posted in Sem categoria, tagged Jornalismo on '4/11/05 9:47 AM'|
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